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domingo, 26 de janeiro de 2014

Coração com defeito...

Convoquei com urgência uma reunião com meu pai e minha mãe. Na sala de jantar, antes de comermos. Gosto da sala de jantar porque me lembra aquelas salas de reuniões dos filmes americanos. Meus pais haviam achado graça por eu ter enviando um memorando por debaixo da porta do quarto deles esta manhã, em filha sulfite, escrito com caneta preta em letra de forma, para transparecer a seriedade da situação. Ficaram o dia todo sondando para saber qual o motivo de tal convocação e eu simplesmente sorria e falava que na hora certa eles saberiam. Na verdade Fiquei ensaiando o dia todo como eu poderia abordar esse assunto com eles. Não era fácil. Ao contrário do que meu pais, e vocês também, devem estar pensando, não é nenhuma superficialidade, menos ainda alguma besteira. A hora estava próxima, eu sentia um frio na barriga, mas respirei fundo e entrei na sala de reuniões... Jantar. Lá meus pais aguardavam ansiosamente. Sentei-me na extremidade oposta da mesa. Olhei-os por um momento. Era difícil. Como eu poderia falar que estava querendo processá-los? Comecei falando do quanto os amo, e o quanto sou agradecido por tudo que eles fazem por mim, mas que infelizmente, eu precisaria processá-los, ou ligar para o procon para reclamar de um defeito. Um defeito de fabricação. Logo, eles, como meus pais, responsáveis cada um por 50% dos genes que faziam parte de mim só poderiam ser os únicos responsáveis pelos defeitos apresentados. Meu pai, ficou sério, minha mãe sorriu. Silêncio. Se fosse possível colocar uma daquelas músicas que marcam cenas fortes nos filmes, teria sido perfeito. Minha mãe então perguntou o que havia de "defeituoso" no "produto" - eu, no caso. Eu senti meus olhos queimarem com as lágrimas que eu havia escondido por tanto tempo. Trapaceiras! Denunciando-me assim deliberadamente, expondo minha fraqueza em público. Se eu tivesse mais tempo acho que as processaria também! Olhei meus pais, que agora pareciam seriamente preocupados comigo. Respirei entrecortadamente por soluços do choro. Firmando um rosto forte e sério - mesmo lavado por lágrimas comuniquei que meu coração estava com problemas. O coração como todo mundo sabe é o orgão responsável pelo amor, e o meu estava com defeito! Falei que eu olhava meus avós, tios, coleguinhas da escola e principalmente meus pais e conseguia enxergar o amor em seus corações. A forma como eles falavam e cuidavam de mim provava que seu amor era maior do que eles, enquanto, eu inútil, continuava pequeno e oco de amor. Como alguém que é nascido e criado no amor mais puro consegue ser assim, infértil, defeituoso? Eu não consegui amar! Eu quero amar! Quero poder oferecer para o mundo pelo menos uma parcela daquilo que eu recebia, queria ser algo mais. Eu era incapaz de amar. Parecia que tudo ao meu redor era pintado com as cores do amor... E por que eu não conseguia? Eu deveria ter algum defeito, e a culpa é do fabricante, logo meus pais. Era horrível o que eu estava fazendo, mas eu vi no jornal esses dias que quando um produto ou mercadoria apresenta um defeito, devemos requerer nossos direitos. Era isso que eu estava fazendo! Requerendo o direito de amar! De ter um coração capaz de amar. Quando terminei meu discurso ensaiado, olhei meus pais, que se olhavam. Pensei, pronto é agora que eles vão contar que sou adotado pra se safarem e eu terei que arquivar o processo até encontrar os culpados! O que era uma enorme besteira, já que todos diziam que eu era acara da minha mãe... Eles me olharam por um momento. Meu pai me disse o quanto estava impressionado com o que havia acabado de acontecer. Minha mãe disse mais, que essa minha preocupação em poder amar e retribuir ao mundo o amor que eu recebia era muito nobre. Silêncio novamente. Meu pai falou que esse processo ou reclamação não seria possível, porque havia muito amor dentro de mim e minha preocupação provava isso. Mamãe disse que todos os dias quando olho para eles é uma reafirmação de amor, e que eles estavam muito orgulhosos de mim. Papai completou dizendo que eu sou ansioso demais e quero que tudo aconteça depressa, e que eu deveria aprender a dar tempo ao tempo, porque aí sim eu conseguiria perceber o quanto sou capaz de amar. A essa altura, minhas lágrimas haviam parado de rolar pelo meu rosto, e cada palavra dos meus pais me encontrava com uma intensidade enorme. Eu amo! Amo tanto que isso havia me deixado incapaz de perceber. Eu amo! Quero amar mais... Perguntei a eles como eu faria para amar mais? Para distribuir mais amor? Eles me disseram que o tempo ajuda, que eu vou crescer e amadurecer... Me falaram que eu provavelmente vou me machucar, porque às vezes o amor dói - acho que descobri isso cedo - mas que eu deveria continuar assim como eu era, para nunca deixar meu coração endurecer e se fechar para o amor. Sorri e pedi desculpas por aquilo tudo... Mamãe sorriu e disse que eu não deveria me desculpar por nada e me agradeceu. Perguntei o porque, e ela respondeu, que sou fruto do amor e não haveria forma maior de mostrar que nosso amor é forte e capaz de tudo, do que a preocupação que eu apresentava por querer amar mais. Os dois levantaram e vieram em minha direção, cada um de um lado me deram um beijo na bochecha fazendo sanduíche de 'eu'. Sorri. Mamãe colocou o jantar na mesa, papai lhe deu um beijo. Jantamos. Quando estava em minha cama, pronto para dormir, eu rezei e agradeci por ter nascido do amor e desejei poder entender mais sobre esse sentimento para poder distribui-lo ao mundo. Sou fruto do amor. Adormeci.

terça-feira, 21 de janeiro de 2014

Mar...

Era um dia normal de sol, praia e calor. Abri o guarda sol naquele lugar especial especial na praia. Era especial pra mim. Estendi a esteira, peguei meu livro e continuei de onde havia parado minha leitura. Lá pelas tantas, sol apino, decidi que era mais do que justo eu me banhar no mar, mas algo me impedia de ir... Medo?! Não sei... Levantei e fui. Teimoso eu sei. Ao pisar na água, olhei ao redor e não tinham muitas pessoas por perto, nem posto dos salva vidas, e um enorme calafrio percorreu meu corpo. Entrei no mar, a Água estava deliciosa, ondas fortes que aumentavam aquela sensação ruim. Me permiti, boiar, dentro das minhas limitações de nadador e foi ai que tudo se desencadeou. Apaguei desse mundo. Consegui visualizar os detalhes da minha morte. Ela estava ali ao meu lado, não vi nada personificado. Mas sabia que poderia acontecer. A corrente me puxaria, como a praia tinha um solo desnivelado eu logo perderia minha base, senti meu corpo afundando, as tentativas de grito, a água ardendo ao entrar em meus pulmões, as batidas de braços e pernas, em vão, aumentando meu desespero, ondas me jogando para o mais fundo. Logo começariam as cãimbras e o cansaço dominaria. Senti meu corpo flutuando para além da dor, para além do esforço, para além. Tudo se desligava lentamente e eu nada podia fazer, só deixaria que a escuridão a minha volta me dominasse. Tudo se apagou no instante momento em que a onda me fez acordar daquilo. um deja vú de tudo se sucedeu e eu tive a opção de deixar acontecer e seguir seu fluxo, mas alguma coisa, não sei ainda o que ainda, me fez lutar, e eu cansado demais, consegui caminhar, nadar ou seja lá o que eu fiz, até o raso. Não estava com medo, nem assustado. Olhei ao redor, nada. Caminhei de volta à minha esteira, sentei-me e comecei a pensar em tudo que havia acontecido. Desligado de tudo. Desconectado. Deixei minha mente vagar e entender o que eu havia experimentado. Estranho, né?! Deveria ser insolação... Arrumei minhas coisas, marquei a página que havia terminado de ler e decidi ir embora. Sai.